ooi

Essa minha habilidade
de ver através das paredes institucionais
e cheirar pensamentos mal agasalhados
ainda vai me custar uma nevralgia.

Eu nem queria ver o que eu vejo
Eu nem queria saber o que eu sei
Portas fechadas e bocas caladas
são boas pois não prometem nada.

A questão é que ainda acredito
no poder da comunicação
e que, talvez, entre tantas bocas
de algumas possam sair borboletas.

Não se trata de ingenuidade,
tampouco suporto os lunáticos,
sou ferrenhamente objetiva,
o que acontece é que
o sujeito que compreende
também é o sujeito que sente.

(Poemas de Tempo e Toque – Bruna de Alencar)

29/10/2019 – Salvador/BA

oii

(Mulher – Gustavo Rosa, 1988)

.

I’m done with formulas
I can no longer
sustain any emptiness.

Your image is vivid
as a firebird
in the dawn.

Running between
systems
across
binary and phonemes
languages.

I’m done with formulas
I mean all those
codes
games
lies
money
lust
vain.

I prefer
daily science
based on
simply try
(results come
anytime).

I’m
no longer
available
for frames.

Bruna de Alencar

Salvador/BA – 28/10/2019

siron

(Siron Franco, 1979)

.

Todo pudor é um anteparo
– razoável, desejável –
mas quem nunca cai
não é o precavido,
é o covarde.

Todos os planos, precários
Todas as notas, funestas
Todos os tecidos, tingidos
Todos os cheiros, fugazes
Todos os homens, fingidos.

Nós somos expostos pelo
OLHAR E PALAVRA
Nós somos compostos de
MEMÓRIA E EXPECTATIVA:
e aí? e agora?

(Poemas Prensados – Bruna de Alencar)

Salvador/BA – 28/10/2019

originaal

(Ascent of the Blessed – Hieronymus Bosch, 1515)

.

Você chega a compor
o tracejado da minha mente,
mas
meu racionalismo não importa,
teu toque é o maior termômetro.

Eu tento compreender a tua imagem
de oitenta formas diferentes,
todas falhas,
(felizmente).

Nas aventuras fora das castidades,
fugir dos puritanos e dos abades:
vestidos em devassidades,
memorialmente desmemoriados
da própria sociedade.

Ávido,
Terrivelmente safado,
Você faz o terreno do meu ser
verter rios de sexo.
Me liquefaço.

Eu te amo como um nocauteado
e contemplo, curiosa,
a força de um querer que não cega.

O som das turbinas que
anunciam a virada.
Te dedilho nas nuvens.

Nem mais um mês suporto
sem o acordar da tua voz
lânguida
e sem o atrevimento da tua
língua.

És belo como o amanhecer
do Espírito Santo,
Rafael, meu anjo profano.

(Poemas de Tempo e Toque – Bruna de Alencar)

Vitória/ES – 25/10/2019

Boss_Croker_octopus

Esses corpos não ocupam
esse espaço por querer
Esses corpos se põem aqui
do jeito que estão
por pura e forte coação.
E uma criança chora.

Esses corpos de agruras,
macilentos, violentos
corpos que se cobrem
de pelancas, de queloides
e exalam cheiros desagradáveis.
E outra criança chora.

Esses corpos que ocupam esse espaço
dormiram, foram sacudidos,
amarrados e imobilizados de madrugada,
Viraram estes corpos desenxabidos,
amarrotados e descontentes.

Esses corpos que gritam por mudança,
gritam de afetação,
gritam de dores nos ossos,
gritam de dores nos músculos,
gritam até que apenas
para conferir
se ainda podem gritar.

Esses corpos que se cobrem de tecidos gastos
sejam os estriados ou os acetinados.

Esses corpos que não queriam ter vindo
São corpos que tentam vencer o cansaço.
E mais uma criança chora.

Esses corpos que têm a mesma inclinação
que todos os corpos da história,
ao longo das margens dos rios,
e também de frente para os mares.

Esses corpos se fixam e acompanham,
mudanças de tempos e ares,
comem pouco, comem muito,
comem errado ou não têm comido.

E agora, trancafiados
sem crime algum
se chocam
uns contra os outros
uns contra os outros
a procura da porta
que está vedada.

Como pretendíamos encontrar
algo diverso do que temos
se nossos corpos erroneamente
compreendem
que precisam ser e estar
uns contra os outros
uns contra os outros?
uns contra os outros!

Aliás, é possível produzir
um corpo respeitoso
e igualmente respeitado?

Dentro desses corpos não há paz
nem no nível molecular.

Crianças choram,
expõem que mal chegaram
e tampouco queriam ter vindo.

Enquanto esses corpos quase indivisos,
agora esmurram as portas.

Certamente vamos morrer logo,
eu mesma já comecei a urrar,
preciso de um banheiro
e alguém sacou um cigarro.

Vamos todos morrer
estupidamente sufocados.

aaah!
a porta da aeronave de abre.

Mas o choro das crianças não cessa.

(Poemas de Tempo e Toque – Bruna de Alencar)

24/10/2019 – Vitória/ES

respeita

A Justiça das Coisas Ínfimas

.

Eu respiro,
(vivo e sobrevivo)
pela justiça
das causas que eu
consigo alcançar;
não vou reverter
desigualdades históricas,
não tenho paciência com tolice:
não sou utópica,
sou política.

A justiça das causas nobres
é a justiça das coisas ínfimas:
a justiça das causas possíveis.

A justiça da água encanada
A justiça do prato saudável
A justiça da roupa composta
A justiça no transporte diário
A justiça de não ter medo do banco.

A justiça do orgulho
de quem percebe que
não é menor que ninguém.

A justiça do abraço apertado
A justiça que oferece cafezinho
A justiça no salário
A justiça no semáforo
A justiça de ter amigos
pretos, pobres, analfabetos
e vivos.

Falar da injustiça da perna amputada
Qual a novidade? isso muda o quê?

A justiça no atendimento
A justiça do entendimento
A justiça do encontro
A justiça que torna
os humanos mais humanos
e menos animais.

(Bruna de Alencar)

Petrolina/PE

ooooi

(Tempestade no Mar da Galileia – Rembrandt, 1633)

.

Percurso de Malogro

Se você ama pela beleza, é falso
Se você ama pela inteligência, é falso
Se você ama pela riqueza, é falso
Se você ama pela miséria, é falso
Se você ama pela libido, é falso
Se você ama pela expectativa, é falso
Se você ama pelo desejo, é falso
Se você ama pela solidão, é falso
Se você ama pela diversão, é falso
Se você ama pela oportunidade, é falso.
Se você ama pela vaidade, é falso.

Se você ama a procura pelo espelho
por tudo que poderia de ter sido,
isso tampouco é verdadeiro e
só conduz a outra forma de
fracasso.

Deixe o ego
em casa
se quiser
amar comigo.

O amor é aquele que te olha com mudez e te diz:
É insustentável amar só lista de referências.
O amor é aquele que paira na inocência.

O amor é um bicho esquivo demais,
e tudo aquilo que tremeluz
em algum momento se apaga:
é este o problema da chama.

Apague a vela,
Ame no escuro,
Ame sem alarde,
Ame sem o alado,
Ame sem discurso,
Ame de verdade.

Você me amaria se fosse cega?
Você me amaria se fosse surda?
Você me amaria se eu fosse burra?
Você me amaria se eu não te dissesse nada?

Só evita o malogro
quem refaz o percurso
do amor absurdo e
ressignifica.

Tenho uma regra clara:
não entro em navio
que no cais já
se encontra
naufragado.

(Bruna de Alencar)

18/10/2019

cacoo

Tempo e traço,
trampo na troça,
trouxe tropeço:
trama da tarde.

Feliz como um trovão
Cálida como um gavião
Muda como uma tempestade.

Tens todo o toque,
tens até o repique,
tens tudo e tosses:
nervosismo de menino
que engasga com a bala.

Bala. Doce. Bombom.
Conceber variações
não é tão difícil,
não é verdade?

Coisas que escorregam dos bolsos,
Coisas que precisam ser mostradas,
Coisas que espatifam no chão.

Instante de meia-vida do amor
Instante de meio-até-logo.
Instante de boa-sorte.

Ô Tonho,
me dá um trago?

(Poemas Cariados e Concretos – Bruna de Alencar)

15/10/2019 – Petrolina/PE

Adalgisa Nery por Portinari

(Retrato de Adalgisa Nery, Cândido Portinari, 1937)

.

I’m just other technical
drowned in the bureaucracy
– luxurious bureaucracy –
dozens of questions instead of roses.

How can I drive up
my poetry?
Turn a beast into a cherub
Turn a sparrow into a nightingale
Turn a melody into a symphony.

Beautiful gadget:
Portrait of cleverness
that you easily find
pressing the enter.

Happily paltry:
Reles. Relais. Relés.
Miúda. Minuscule. Tiny.

Run away from
the ugliness
we’re living in:
serendipity.

How can I vanish without being chased?

Oh! look!
I’ve painted my nails!

Bruna de Alencar

16/10/2019

the easer

(The Eraser – Thom Yorke)

.

Sou concreta, me querem abstrata
Sou latina, me querem alemã
sou singela, me querem impositiva
sou mulher, me querem neutra
sou poeta, me querem burocrata
me querem até guerrilheira,
quando sou diplomata.

Esperam que eu jogue a toalha?
esperam que eu peça por menos?
pretensões que me causam gargalhada:
serei estupidamente ousada.

Não aceito promessas de rouxinol
afinal a cotovia é mais bem humorada
(embora nacionalmente erradicada)
e o entendimento segue massa de pão.

É preciso saber bem mais
misturar farinha e água
abrir por conta própria,
com firmeza sovar, sentir,
e assar no ponto da sedição,
(é preciso saber bem demais).

Afinal, o que haveremos de fazer
se o conhecimento realmente for
essa coisa resplandecente e afiada?

É preciso cozinhar para suportar
uma realidade bem compreendida.

***

Que bela noite enluarada!
Sussurro um beijo ao vento.

Deito na prensa de gritos, gritos
devidamente coberta de grilos, grilos
e não me sobra mais nada, nada, nada.

(Poemas Cariados e Concretos – Bruna de Alencar)

15/10/2019 – Petrolina/PE

van gogh

(O Carteiro: Joseph Roulin – Vincent van Gogh, 1888)

.

Problemas de Sumiço dos Correios

Estou a colorir os envelopes
das cartas que não enviei,
alguma coisa aqui dentro
não foi mais necessária.

Minhas palavras puderam ficar
apenas guardadas em casa,
não precisei sequer
ocupar o carteiro.

***

– Não nos envie um contrato –
e tampouco
– nos envie um poema –
não temos tempo:
não nos confunda
com desocupados.

(Não sentimos muito
apenas não sentimos nada).

***

Ô meu Deus:
o que mesmo temos comunicado?

(Poemas Cariados e Concretos – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 15/10/2010

hard

(Dois figurões burocratas de médio porte,
por volta dos 60 anos, se sacodem, estarrecidos)

***

Corre, Romildo!
Avisa ao magistrado que vamos precisar
suscitar um conflito de incompetências!
Esses meninos são muito ágeis!
Só pode ser malediência!
Não é possível! eles furtaram nossos problemas!
e resolveram em uma só tarde!
como pode? eles são muito jovens!
E agora? o que faremos?
Será que precisaremos aprender tudo de novo?!
Não pode ser!
Isso soa como o fim da humanidade!

***

(Toda época tem a classe média
que se pretende de inamovível porcelanato).

(Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 13/10/2019

carne

(Resignação Diante do Irreparável – Ismael Nery)

.

Apresento-vos, senhores:
As aventuras de um cérebro que nunca dorme
a grandiosa máquina sempre ligada no 220v
que todos querem alugar por preço módico,
que fere qualquer fera com sua prodigalidade
– quanto azougue, que felicidade! –.

As aventuras de um cérebro que já passeou bastante:
entre falésias e geodésicas
entre falácias e apoteoses
entre política e homeostases
encontramos esse processador de grande utilidade!
(o único problema é que ainda seja de carne).

(Poemas Prensados – Bruna de Alencar)

13/10/2019 – Petrolina/PE

neryyyyy

(Adalgisa e o Artista – Ismael Nery, 1930)

.

Eu gosto de pegar os caminhos errados
Só para fingir que existem os corretos:
nem lá, nem cá
o que vale é estar desperto.

Eu gosto do caminho comprido
Nele há mais encontros bonitos
– se demoram indefinidamente –
as pessoas são menos esquivas
e os sonhos são mais ambíguos:
há tempo para vasculhar
até o ovo da serpente.

Eu gosto de pegar os caminhos tortuosos
Eu gosto de dar voltas e gosto do gasto,
Eu gosto do pranto e gosto do espanto
(É um cisca daqui, um cisca de lá)
Eu gosto até do erro de ser humano.

Eu gosto de estar acompanhada
por tudo aquilo que me cerca.

Eu gosto de pegar os caminhos abertos
Eu gosto de ver as cores, os objetos
Eu gosto dos diálogos circundantes
Eu gosto de rasgar e gosto do retoque
Eu gosto até das vias que parecem chagas.

Eu gosto de pôr a mesa e esperar pela fome
do dedilhar macio e da aspereza do toque
Gosto de comer com os dedos descobertos
Eu gosto do gosto de tatear teu sexo no claro.

Eu vou me entretendo enquanto tu não chegas
Eu vou brincando de olhar enquanto não paro.

(Poemas de Tempo e Toque – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 12/10/2019

Morte de Ismael Nery - Ismael Nery

(Morte de Ismael Nery – Ismael Nery, 1932)

.

Tenho medo de não ter medo:
você imagina como é não hesitar
mesmo diante do fogo?
O suicida é um corajoso.

Que venham articulações simbólicas
todos os julgamentos precipitados:
Não canso de carregar a pedra lado-a-lado.

Não me assusto com batalhas fadadas ao malogro
virei um animal tão forte que a pele não cansa:
24/7 na procura certa de razão e alguma esperança,
o verso se interpõe entre os olhos que raspam o chão.

Eu cresço todo o dia sem assombro e com muita dor
Trompetes, trupicões, contratos de trespasse e tonturas
A trama do dia que decai e denuncia a meia-vida do sonho
Vitórias e fracassos se autorregulam, adaptados em nova frequência
Santos de salto a solver o sentido, assim te sirvo o erótico e o mundano.

Com tique-tique do relógio de cotovia
o meu intuito é mostrar a queda:
crescimentos são retrações
só que do outro lado.

Talvez seja só mais um incontroverso
caso fortuito de antiácido.

Em um jogo de espaço e tempo
o verdadeiro sentimento é inominado.

(No poema serei vasta e insensata
sem precisar me entulhar de desculpas).

(Poemas de Toque e Tempo – Bruna de Alencar)

12/10/2019 – Petrolina/PE

NERYYY

(Retrato de Murilo Mendes – Ismael Nery, 1922)

.

Mais um dia coberto de alegoria
em meio ao som dos passos ausentes
eu de novo comigo no espelho
a encontrar todos aqueles
que sempre ficam de fora.

Ninguém nunca me toca
porque estou sempre na frente.

Novamente eu espantei todo mundo
com meu saber que termina em tontura.

Eu queria conseguir parar
mas não posso:
não consigo ser
autocondescendente.

A lentidão tem lá sua serventia:
entender rápido demais
é a maior causa de nevralgia.

Para o impaciente o maior desafio
é produzir a beleza calma
de um silêncio imperioso
que se retroalimente.

(Poemas de Toque e Tempo – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 12/10/2019

Neryy

(Casal em Vermelho – Ismael Nery)

.

Por que eu quis querer
o que o tempo não arde?
Não quero um desejo volúvel
– isso não é uma potestade –
Não quero um amor que entorte.

Não quero mais uma briga
Quero o amor, quero um amante
e não um litisconsorte.

Não tenho um coração de pano
tenho um pedaço de carne álacre
Cuida, respeita
espero que nele encontre
alguma chave
– só sua, nem me mostre –
e com ela siga,
seu bater de assas
como um acorde.

(Poemas Prensados – Bruna de Alencar)

27/09 – Petrolina/PE

paulo rossi

(Retrato de Paulo Rossi Osir – Portinari, 1935)

.

Estado de Mínimo
Ao amigo, irmão, compadre
um prato de fome
servido à vontade.

Estado de Mínimo,
Pudor de veneta.

Estado de Mínimo
No qual o vizinho bom
é aquele que já vai tarde.

Estado de Mínimo
do mar do mundo de fora
à falta de saneamento de dentro.

Estado de Mínimo
vestidos com os trapos de outrora
cremos na força do calço de porta.

***

E, em resumo, é só isso.

Nada posso tratar para além disso:
Eu não estudei sua métrica com corpo de fundo.

Eu estava ocupada demais dando os recados
da jurisdição, do Estado, dos cartórios:
a mim cabe recolher obituários
sem nenhuma complacência.

E é então este o meu ofício de fome
que desempenho com algum ódio,
queixume
e fama.

(Poemas de Gente Política – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 09/10/2019

bomb

Eu soube que vocês não amam mais nada
além das pretensões salariais aumentadas
então os procuro para satisfazer
Uma curiosidade simples:
com tanto cinismo ainda é possível
sentir o gosto de algo?

É fácil ser tão descarado?
Não doi? não deixa marcas?
Você já carregou um corpo nas costas?
Você já entendeu a força em uma haste que dobra?
Na escola vocês estudaram cinemática?
pois não parecem conhecer
o peso do corpo que tomba.

Talvez a física
talvez a lava vulcânica
(sobre seus olhos de rapina)
consigam refrescar a memória
dos grandiosos homens
para que lembrem dos outros homens:
Não se sirvam direto nas baixelas,
há pratos de sobra.

(Poemas de Gente Política – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 09/10/2019

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Com a poesia eu faço questão
de não ganhar nem um centavo,
podem respirar aliviados
continuem a comprar rifas.

Minha poesia não procura solidariedade
pois para ela procuro conceber liberdade
até para que seja medíocre
(como é o esperado para a atualidade).

Como é bom não ser mais um artista infame
não ser mais um gavião à procura de rima:
não me importa que gostem
não me importa que paguem
me importa que sintam.

Pela poesia eu faço questão
de calar todo o resto do mundo:
a política em um peão subsumo
(Os egos giram rápido demais no ocidente).

(Poemas Prensados – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 09/10/2019

NEOLIBERALISMO

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Encontre algo que você ama e faria de graça
(pela vida toda!)
Encontrou?
ótimo!
Agora cobre
(TED, DOC, boleto e cartão de crédito):
depressa!

(Poemas Prensados – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 09/10/2019

pernambucp

Não consigo sustentar os vínculos
Não consigo sustentar as plantas
no exercício de estar perto e longe
eu sou aquela que sempre se espanta:
não aguento o contato forçado,
minhas retinas cansam e calam.

Tantas pessoas pelo caminho,
muitas verborragias tolas,
eu nem gosto de todo mundo
e tampouco ouso ser carente:
me deixem quieta no escuro
não quero aqui tanta gente.

Amo todos aqueles que identifico
como aqueles que choram e sorriem
e não me impõem grilhões de simpatia:
eu passeio por entre as amizades
e na minha idade e no meu estado
só é preciso fé, força e fantasia.

(Poemas Prensados – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 06/10/2019

saramagoooo

Todas as coisas são
sobre a vida e a morte
e o amor é a pretensão
que compõe às condutas
(mesmo que tortas).

Não existe nada alheio
à dor da vida expressa:
as crianças abrem o berreiro,
os adultos sacam o isqueiro,
os velhos olham e acenam.

Tempo, inescapável companheiro
me atravesse com calma,
tenha dó dessa viva’alma.

Doi não ser descrente
e tampouco ser asceta:
queria só poder te amar em paz
mas o mundo não cessa.

Como te encontrar
se te perco (brandamente)
nesses segundos distantes?

Me doi essa política de rompantes
(que mais me machuca do que liberta)
para qual é preciso estudar tanto
afim de conceber bons encontros concretos.

A vida das gentes desperta o pranto:
maldita angústia de querer ajudar
e ousar estar desperto
(a atenção também cobra um preço).

Por que diabos concebi
esse jogo para escapar
dos inúmeros moldes terrenos?
maldita ânsia de querer mais coisas
do que essa vida comporta.

Abre a porta de casa, meu amor
me deixa pousar na tua sanidade.

(Poemas de Toque e Tempo – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 06/10/2019

simpsons

É fácil amar de longe
difícil mesmo é amar
quando, sobre o mesmo teto
se descobre que o belo gajo
também é passível de ser abjeto.

É fácil amar os valores intocáveis
Difícil mesmo é amar
no preconceito das trivialidades.

É fácil amar aquele que tem
febre, dor de dente e catapora
– numa risada tudo evapora –
difícil mesmo é amar
quem gosta de lamúria
e te pretende condescendente.

É fácil amar o profissional medíocre,
o barbeiro cansado
e até o desempregado,
difícil mesmo é amar
o homem soberbo,
escondido tão tão fundo
que se faz semiárido.

É fácil amar quem xinga, grita, apavora
e volta, de esguelha, portando vergonha:
É fácil amar quem se excede e arrepende
difícil mesmo é amar
o leviano, o sacana.

É fácil amar o esfomeado, o grosso
difícil é amar o mesquinho, maldoso
– e o traidor tem sono leve –.

É fácil amar quem cai, se quebra e levanta
Difícil é amar o heroi, o personagem, a figura.

É difícil amar quem não chora.

E talvez aí resida o erro:
quem mais precisa do amor
são aqueles que menos são amados.

Muito bom, muito bem
procuremos então os voluntários:
nada é fácil
pois viver continua a ser
um exercício de falar de corda
em casa de enforcado.

(Poemas de Tempo e Toque – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 05/10/2019

rivera

(Diego Rivera, Epopeya del Pueblo Mexicano).

Basta!
Nós não queremos suas credenciais
Nós não queremos suas titulações
Nós não queremos mais um disfarçado:
Nenhum de vocês mora desse lado do Estado
Nenhum de vocês comeu pó,
implorou pelo pão
ou sequer foi beliscado.

Basta!
Burgos dentro de burgos dentro de burgos
Que união? que consenso? que compaixão?
Não habitamos sequer a mesma língua
Nenhum de vocês intercedeu por nosso choro
Nenhum de vocês tocou nossos mortos
pois para nossa gente não se constroi cemitérios:
a nossa dor carece de lápides.

Basta!
Nós não queremos soluções baseadas em ausências
Nós não queremos floreios, afrescos e faixadas
Nós não queremos terno, gravata e elaboração
de quem sequer ousa segurar nossas mãos:
Não se finjam de companheiros,
um conhecimento altivo não constroi nada
quem constroi é a mão do pedreiro.

Me dê, quem puder achar
um estivador com alguma sonata
ao invés de um belo doutor
com sua concupiscência malograda.

Nós não queremos seus referenciais
Nós não queremos seus livros rotos
Pois nós sabemos, nós percebemos:
Eles são poliglotas,
Nós somos politécnicos.

(Poemas de Gente Política – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 02/10/2019

fhfhgf

Eu não vim aqui para lamber o poema
não me importa o que rima de mais ou de menos.

O que me importa é cortar todo o resto
é evidenciar os estratagemas,
os trupicões da linguagem,
um verso que rasga verbo,
a dor que reverbera na tarde:
o propósito do poema
É por o sentimento em copo de vidro.

Aqui simplesmente temos, meu caro
As denúncias de si
daqueles que cansaram de ser covardes.

Então não me importa cheirar o poema
Ele não exala fragância
e, embora produza flagrante,
não é uma arma,
mesmo que branca:
Você não precisa afiar o poema
no mundo há outras instâncias.

É preciso construir governança,
é preciso talhar o leite;
é preciso envelhecer com sustância;
é preciso estudar e ser estudado;
é preciso ter abrigo para o corpo;
é preciso beijar e ser beijado;
é preciso até morrer com pujança;
e sem isso, certamente,
o poema nem merece ser contemplado.

Apresento então essa coisa disforme
curtida em barris de aspereza,
o poema é só mais uma forma andança,
na vida o que prezo é integridade.

Fazer versos
é um mero acidente
herdado de criança.

(Poemas Prensados – Bruna de Alencar)

Petrolina/PE – 01/10/2019